que tinha um aquário
com um peixe vermelho.
Vivia o peixe tranquilamente
acompanhado pela sua cor vermelha
até que principiou a tornar-se negro
a partir de dentro, um nó preto
atrás da cor encarnada.
O nó desenvolvia-se alastrando
e tomando conta de todo o peixe.
Por fora do aquário o pintor
assistia surpreendido ao aparecimento
do novo peixe.
O problema do artista era que,
obrigado a interromper o quadro
onde estava a chegar o vermelho do peixe,
não sabia que fazer da cor preta
que ele agora lhe ensinava.
Os elementos do problema constituíam-se
na observação dos factos e punham-se
por esta ordem:
peixe, vermelho, pintor — sendo o
vermelho o nexo entre o peixe e o
quadro através do pintor.
O preto formava a insídia do real e
abria um abismo na primitiva
fidelidade do pintor.
Ao meditar sobre as razões da mudança
exactamente quando assentava
na sua fidelidade, o pintor supôs que o peixe,
efectuando um número de mágica,
mostrava que existia apenas uma lei
abrangendo tanto o mundo das coisas
como o da imaginação.
Era a lei da metamorfose.
Compreendida esta espécie de fidelidade,
o artista pintou um peixe amarelo.
Os Passos em Volta
Herberto Helder
foto:martikson_'neck'