sexta-feira, 30 de janeiro de 2009

Era uma vez um pintor
que tinha um aquário
com um peixe vermelho.
Vivia o peixe tranquilamente
acompanhado pela sua cor vermelha
até que principiou a tornar-se negro
a partir de dentro, um nó preto
atrás da cor encarnada.
O nó desenvolvia-se alastrando
e tomando conta de todo o peixe.
Por fora do aquário o pintor
assistia surpreendido ao aparecimento
do novo peixe.
O problema do artista era que,
obrigado a interromper o quadro
onde estava a chegar o vermelho do peixe,
não sabia que fazer da cor preta
que ele agora lhe ensinava.
Os elementos do problema constituíam-se
na observação dos factos e punham-se
por esta ordem:
peixe, vermelho, pintor — sendo o
vermelho o nexo entre o peixe e o
quadro através do pintor.
O preto formava a insídia do real e
abria um abismo na primitiva
fidelidade do pintor.
Ao meditar sobre as razões da mudança
exactamente quando assentava
na sua fidelidade, o pintor supôs que o peixe,
efectuando um número de mágica,
mostrava que existia apenas uma lei
abrangendo tanto o mundo das coisas
como o da imaginação.
Era a lei da metamorfose.
Compreendida esta espécie de fidelidade,
o artista pintou um peixe amarelo.

Os Passos em Volta
Herberto Helder

foto:martikson_'neck'
a simplicidade de existir,
a descoberta de um mundo
misterioso e diferente
a procura do equilíbrio
uma bola,
uma corda,
um beijo, uma mão,
sorrisos..

“e se…”
pedro correia

somos assim.
eu gosto de ver, de sentir,
de aprender.
tu gostas de ouvir, de vencer,
de amar.
somos animais dotados de sentidos.
cinco deles… ou não.
seres de in(finitas)capacidades,
somos pares nas pequenas diferenças.
eu vejo-te.
tu ouves-me.
senta-te comigo.
eu que vejo mas que sou
tão mais cego do que tu.
tu que me ouves e que escutas
tanto mais do que eu.
somos assim.
somos bons e somos maus.
eu engano-te.
tu manipulas-me.
e eu consigo mais que tu...
quem, eu o forte ou tu o sábio?
… não vale a pena.
somos efémeros.
eu no limite de ti.
abraço-te…
somos iguais.
somos assim.

(In)capacidades_mafalda martins
companhiautista

Undeclared - The Dodos

Horse Feathers

tenho um fascínio
por tudo o que é antigo,
que vive no passado.
filmes parados de
palavras engolidas.
histórias absurdas.
excessivas.
inconsequentes.

quinta-feira, 29 de janeiro de 2009


quando a felicidade
se diz com luz
e com a boca
foto: martikson_'la ...'
azul.
como se na ideia da chuva
o olhar pudesse domar a fala
de um dado momento.
chamem-lhe o céu. e assim
descrever o que quer que vimos,
cá dentro,
nisto inumerável e milagroso,
nesta profusão de acaso.
como as palavras nos falham,
como nada sai bem
no dizer disso, o desejo.

Poemas Escolhidos (adapt.)_Paul Auster


pela magia de tudo..

quarta-feira, 28 de janeiro de 2009

terça-feira, 27 de janeiro de 2009

Lotte Kestner and Joe Fraley - All The Dark You Need There


cumplicidade..
............
............
............
Kiss me
take my hand
let's kidnap
each other
............
............
............

08/06/08 Akira Kosemura 『Light dance』

Por tudo. Por vida. Por intensidade. Pela verdade. Pela sensibilidade. Por estares.Sempre. Pelo tanto. Pela entrega. Pela fragilidade. Pela incoerência. Odeio-te. Pelas palavras. Por dizeres o meu nome.Pela adolescência. Pelos cigarros. Pelas noites. Febris.Odeio-te. Odeio-te. Pela alucinação. Pelo corpo. Pela canção. Por Sintra. Pelos braços. Mãos. Gigante.Voz. Lorelei. Pelo rock badalho. Por uma bonita casa. Muito próxima dali. Da parede. Pelas gaivotas lá. Em vertigem. Pelas rosas. Pelas criaturas minúsculas da gaveta. Bonito.Pela navalha. Por estas ruas. Luzes. Olhares. Odeio-te. tanto..

segunda-feira, 26 de janeiro de 2009

The National, Slow Show

ajudas-me a
caminhar, hoje?
hoje, dói-me tudo..
Opening my eyes
Clouds go floating by
For a while
I see your smile
For a while
I go high...
Now we fall in sleep
Ever lost you know
I could cry, in your eyes
I could cry, when we try
I could die in your smile
[..]
Cranes_'Reverie'
não cheguei a dizer-te tantas coisas.
o nosso tempo sempre foi estranho,
no limite das forças do corpo.
não cheguei a dizer-te que podíamos ter-nos encontrado
junto ao mar, naquele caminho de traves suspensas.
pertinho do castelo. a uns cem metros de ti.
gosto de ficar lá. a perder o chão.
também gosto das chávenas a saber a sal. rudes.
e de cabelos espessos, parados de um encantamento lindíssimo
que só aquelas manhãs de ti conseguem dar.
cheguei a dizer-te que adoro o mar.
engole-me as palavras feias e molha a pele de uma luz
indescritível .
ou, talvez seja como a tua voz, forte.
ou a tua entrega. verdadeira, sempre.
há dias em que me devolve tudo.
muito em dias de ontem, de domingo.
e é insuportável tanta luz.

foto: pedro noel da luz

há borboletas assim. que precisam de mãos.

dia muito difícil
de recolher a alma
foto: gérard castello lopes/cutileiro_'Lorelei'










... ... ...

domingo, 25 de janeiro de 2009

Pictures signify everything in
the beginning. Are keepable.
But the dreams freeze
.


qual é a cor do teu sono?às tantas, tem esse desejo dos segundos. de mar. às tantas..

Something eats at me
I smoke too much
I drink too much
I die too slowly


heiner müller


Can a people be strong without having its own poetry?

Blow-Up - End Scene (Perception of Reality)

domingo. chuvoso.
hoje, é dia de fnac.
na nossa.
uma mensagem de

inevitabilidade,
inócua no vazio.
um olhar caleidoscópico nas

endorfinas do corpo.
reis de rosas a escorregar pelas coxas
no meio dos ecos do Lautréamont.
mundo terrível de caudas de
peixes voadores, polvos alados e
homens cabeça de pelicano,
sem tréguas…
escada em ascenção,
vertigem na vertigem.
acordo, no meio da apneia.
como a criança que é chamada
para o jantar a meio da brincadeira.


sábado, 24 de janeiro de 2009

La Notte

The Voices In Her Head

era uma vez uma floresta
que escorria para o mar.
as histórias começam sempre assim,
no era uma vez.
e povoam-se de scones e chás
e personagens bonitas,
vestidas de veludo e pés bailarina.
um menino, muito frágil, habitava esse mundo,
tão belo quanto animal e cheio de
monstros encostados às paredes.
uma vez, perguntei a esse menino se queria
mostrar-me essa floresta tão dele, de mão dada.
disse-me que não prometia nada e que,
aliás, o melhor seria fugir-lhe.
fugir dos imensos demónios
que esconde debaixo da cama.
claro que não percebeu logo que eu
também rezo muito pagãmente e que
tenho obsessões tremendas por
memórias a acontecer.
não de ilusões, não de poesias,
mas de tudo o que é cru.
de olhos.
perguntou-me porque raio
fui parar àquele altar e
respondi-lhe, tão em paz quanto frágil,
que por falta de densidade.
por falta de densidade, expliquei-lhe,
flutuo no meio de labirintos.
por entre sofás, num chão de
restos de lápis e de corpos.
por salas de sons de gaivota e de céu.
em ruas gastas de amor e saudade.
numa cidade linda, à noite.
viu, de repente, um vidro sujo
entre ele e eu, que não era ele, porque
deixava passar a luz de um abraço
em pontinhas de pés.
deitada, encolhida, do lado esquerdo do corpo,
viajei alto, por estradas a acontecer.
de regresso a casa, confessei-lhe um
um amor gigante.
e o menino adormeceu em paz.
esta história pertence às histórias
de finais felizes.
e deviam ser assim todas as histórias de
meninos frágeis.

sexta-feira, 23 de janeiro de 2009


sssstill still.......


foto:martikson

Damien Jurado: Hiding Ghosts music video

Belle and Sebastian - The Wrong Girl


É. Difícil pôr os pés no chão...

James Thiérrée - Au Revoir Parapluie


lindíssimo!

Einstürzende Neubauten ATP April 07

de ser intermitente,
acontece-me frequentemente
entrar no sonho
quem estava comigo antes.
percorreste comigo um caminho
tão igual a este mas não este,
onde bruxinhos e arrudas nos juraram
amor eterno

naquela cama divina.
disse : ‘quero sentir a tua alma’ e tu
respondeste que sim.

quinta-feira, 22 de janeiro de 2009

Contemporary dance


e o que resta depois? sabes?
quando era pequenina, devorava em silêncio
uma colecção de livros de pintura que o meu pai tinha na estante. gigante.
tinha uma adoração interminável
por aquela caixinha de cartão duro,
talvez a lembrar os brinquedos antigos,
de onde saíam oito livros, dos mais conceituados pintores renascentistas.
lembro-me de perder horas a fio com o Bosch,
absorvendo aquelas imagens tão intensas,
como se fosse o episódio mais interessante
da melhor história dos livros pequenos.
folheio agora a colecção e não sinto
o fascínio do silêncio parado que retenho na memória.
o imaginário do Bosch pairava nos corredores
das vésperas dos almoços na minha avó,
quando o meu tio pintava telas enormes
de pinceladas esquizofrénicas.
gostava de me sentar na cadeira que ficava
de frente para as pinturas e povoava aqueles vermelhos fortes
com os anjos que ouvia ao longe, das conversas à mesa.
tinha imensa curiosidade sobre 'Gabriel' e acho, agora,
que faz todo o sentido este apelido redentor
numa família tão pecado.
à noite, tenho miragens sobre esse
'lado do espelho que não é o outro'.
foto: martikson_'falling asleep'
no meio de
guardanapos vulgares
e de pessoas mais bonitas
que em dias normais,
- ‘repara o quanto de
histórias trago em mim’-
...amanhecer de um café
num largo tão neblina,
hoje.
(a Baixa tem este inexplicável.
palavras suspensas em fachadas esbatidas)
Ela não se come,
mas devora-se a si mesma.
Restauro-a.
Dou-lhe um som
para que ela fale por dentro.
Perco-a.
Recupero-a.
Volto devagar a
colocá-la na fome
A ti,
o modo como chamas..
o maior perigo.
Com os teus lábios
podes destruir-me.
E peço-te um coração
de criança ao colo.
Interior-
Mais interior do que o sangue
que me darás-[..]
Depois, guarda a manhã,
o ponto mais alto da luz
em explosão.

de Explicação das Árvores e de Outros Animais (adapt.)
Daniel Faria
foto: martikson_'my demon'

quarta-feira, 21 de janeiro de 2009

Lufa-Lufa, Boulevard

Tom Waits - You're Innocent When You Dream

Promenade // Lemon U2 Acústico en Bar Armenia 230108

Demónio - anjo
Brincar - parvo
Cama – solteiro
Restos de lápis – chão
Risquinhas – delicioso cansaço
Confio – sincronicidade
Mãos - pianista
Fantasmagoria – ela
Tragicomédia – ele
Perversidade – lady..
Paralelipípedos – subir-te
Luz – a tua
Palavras – fazer amor
Feliz – entra
Paz – peito
Pele – parede
Parede – urgente
Toque – subir-te
Casaco vermelho – magia
Boina – deux-moulins
Tatuagem – um, dois, três
Cigarro – era uma vez..
Preto – em ti
Chá – prazer
Pulso – excessivo
Absurdamente azul – primeira vez
Olhar – silêncio
Corpo – cru
Frágil – ventre
Reflexo – em ti
Carrossel – violências
Sabrina – menina
Menina –mulher
Gaivota – lá
Lua – D.Sylvian (no outro)
Beijo – tu
Tu – gosto-te
Jasmim – loucura
Luz amarela – tua rua
Cabelo – lorelei
Som – to the end..
Dedos – dentro
Ceuta – procura-me
Alma – em éter
Amo – letras que escrevem silêncio
Química – possíveis
Tremo - paixão
Hoje - tremo
quando tudo...

THE LEGENDARY PINK DOTS

The National - Aula Magna Lx 17 Gospel part 17/18

terça-feira, 20 de janeiro de 2009

The Innocence Mission - I Never Knew You From The Sun

i don't want to see you - camera obscura

For the Lunar sea see the river moon
And you got it
Match the finest words to the greatest tune
And you bought it
See me cross in style
Walk the longest mile in a minute
Where do drifters go?
Wonder if they know there’s no limit
At the rainbows end
Find a perfect friend say you’re sorry
Make me dream at night
Break my heart on sight don’t you worry
Swept the sounds of love from the skies above
And I knew it
Swim the seas of blue just to drown in you
And I blew it
You hear it, the shiver in spine don’t come near it
I love it, you soar and you cry rise above it
Got my lunar sea for you’re river moon
If you let it
Match my finest words to your greatest tune
Won’t forget it
You hear it, the shiver in spine don’t come near it
I love it, you soar and you cry rise above it
Fly by lunar sea lullaby

Camera Obscura_Lunar Sea
foto: martikson_'closer'

Camera Obscura - Hands Up Baby

The Size of Things

a bela adormecida perdeu
o laço da sabrina
de tanto que lutou.
aos saltinhos pintou
bolinhas coloridas
nos paralelos que pisava.
inventou o nome de
rua arco-íris
a esse sítio onde te dás.
e brincou assim,
até ao nascer-do-sol.

segunda-feira, 19 de janeiro de 2009

Une vieille maitresse 2007 French

each of us has only
one life to live, and
what happens once
will never occur again
and might as well not
have happened at all.
logic life is, ultimately,
insignificant.

Milan Kundera
(lá, aqui, parecido com isto)
diz ao teu amigo realizador,
muito guarda segredos, e sonhos,
que eternize a nossa história.
dê-lhe uma cidade. Praga sem dúvida.
e faça-nos gigantes nos nossos
impossíveis possíveis.
naquela magia do cinema
de mostrar tudo tão bonito.
mesmo aquelas imperfeições
inocentes de criança.
quando olharem para nós, um dia,
só poderão dizer que foi
verdadeiro e branco este amor.
quebrou bloqueios em torres
tão iguais a esta nossa.
e frágil porque somos, no fundo, assim,
dois seres que estão aqui receptivos
a uma mão, a um pulso,
a adormecer no ombro um do outro,
a saltar de mãos dadas na poeira de um
concerto de rock bandalho
e deixarmo-nos cair nus na loucura.
em imprevistos. sempre.
não sei como termina a história.
mas ele saberá. sabem sempre.
são os artífices deste teatro.
caixinha de música tão de asa.

domingo, 18 de janeiro de 2009

por entre a complexidade
[..] de um caleidoscópio
entrego um corpo vazio ao mundo.
e busco seres habitando
o significado profundo
[..] da noite interior.
gotas de água salgada
escorrem pelas mãos
numa alvura extrema
e na dimensão profundamente
abismal do silêncio.
o exacto sentido da
queda das palavras.
quando o tempo orbitava
em torno do útero
e as mãos fundavam um
inocente contínuo com o presente
descobri um espaço ausente
por dentro de um punho
onde cuidei ser possível
encerrar o futuro :
a ininterrupção primacial da luz.
caminhas nas noites interiores
como um ser habitado
pela loucura.
como se trouxesses um
cigarro preso nos lábios
decantando essências no fogo
de cada inspiração.
deitas as cinzas sobre o chão
..reminiscências de efemeridade.
trituras ossos, fábulas
e fantasmas
dando-me a comer
o sentido primacial do voo.
hoje, o sentido do eterno invade-nos


do fundo do silêncio (adapt.)
rui amaral mendes
foto: nelson d'aires
quando dois corpos
a temperaturas diferentes
se tocam,
a sua temperatura
tende a igualar-se.
assim é nas palavras.
e dizer 'odeio-te'
só pode ser doce
no momento da loucura
foto: karina bertoncini

sábado, 17 de janeiro de 2009

'o chá japonês, maravilhosa alquimia
de aromas liquefeitos, é a bebida mais
suavemente agradável que pode
oferecer-se ao nosso paladar
(não de todos porém,
mas um paladar sentimental,
um tanto sonhador...
que nisto dos nossos órgãos de sentir
há temperamentos,
aptidões afectivas características...)'
de súbito, tive uma vontade enorme de silêncio
e de dar à minha a tua boca
..verdadeira impressão de gozo..
o culto do chá,
wenceslau de moraes
geisha [gei_art; sha_person]
passei duas noites a perguntar a mim mesmo :
que faltará ao meu quarto ? por que razão me incomodará tanto aqui estar ?


um encontro fortuito e efémero.

trazia um bonito chapelinho amarelo e uma encantadora mantilha negra.

estive quase a arder e tive bastante medo.

ele, solitário e tímido, que deambula por entre a multidão
como um fantasma e se exila no mundo do sonho
para fugir ao prosaísmo do quotidiano.

- mas como ? por quem se apaixonou então ?
- por ninguém. por um ideal, apenas, por aquela que em sonhos me visita.


ela, momentaneamente desesperada,
procura a salvação das suas frustações através do amor.

via abrir-se uma janela em cujas vidraças haviam tamborilado uns dedinhos delicados.
que força terá feito brilhar estes olhos pensativos e tristes ?

arrebatamento de um minuto..efémera beleza.
e lamentamos não termos sequer tido tempo de amar.

entre eles, estabelece-se, durante algumas noites,
o diálogo-confissão,
com o estranho compromisso de não ultrapassarem
a fronteira da amizade fraternal.

- e agora, já me conhece ?
- um pouco. olhe, por exemplo, porque treme ?

não sei se já lhe disse alguma tolice. se assim aconteceu, diga-mo francamente, pois aviso-a de que não sou susceptível…


mas onde se situa a fronteira entre a amizade e o amor ?

terá sido pecado experimentar por si uma fraterna (com)paixão ?...desculpe, eu disse ‘compaixão’ambos acabam por admitir que a transpuseram.


meu Deus! um minuto inteiro de felicidade!
afinal, não basta isso para encher a vida inteira de um homem ?..

- conheço-o como se fôssemos amigos há vinte anos..não é verdade que não me trairá ?
- juro-lho! ...



mas quando regressa aquele que para ela foi o primeiro amor,
despede-se do ‘amigo’, lamentando que eles
não possam fundir-se numa única e mesma pessoa para,
como desejaria, poder amar os dois
indivisa e simultaneamente.

então é possível ? será possível que não nos voltemos a ver…tudo ficará por aqui ?
é o seguinte : não posso deixar de aqui voltar amanhã. sou um sonhador.


Noites Brancas
Fédor Dostoievski

Quate Nuits D'un Rêveur, 1971, by Robert Bresson

não, não somos, de facto, a mesma..
foto: lilya corneli

não mando, seria feio. se só deixasses, também não seria bonito..

Jonathan Wilson

sexta-feira, 16 de janeiro de 2009

ter a capacidade de amar amar
amar alguém
alguém
amar
alguém ou algo
amar
na vida
ser capaz de pôr nisso
todas as forças
forças

toda a capacidade que
no fim de contas é a
capacidade de vivervida
vida

vida


Agustina Bessa-Luís

Sinto-me muito insegura com
o brilho da luz na água do mar.
Não gosto do efémero..


Agustina Bessa-Luís
foto: martikson 'deep'

Hope Sandoval - Down the steps

Si vous aimez quelqu'un
vous lui-dit demain
'Le ciel est blanc'.
Si c'est moi je réponds
'Mais les nuages son noirs'.
On saura comme ça qu'on s'aime.



Les Amants du Pont-Neuf
Leos Carax
foto: martikson 'white side of dream'

quinta-feira, 15 de janeiro de 2009

um corpo é certo:
o teu, sem dúvida.
assim mesmo
apaixonadamente decorado
para que nunca o perca.



Poe-Mas-Com-Sentidos
Wanda Ramos
foto: dresden dolls

Tori Amos - In springtime of his voodoo

Estava eu sentado
num velho café vazio,
a tomar chá,
quando reparei que
no tampo da minha mesa
caminhava uma criatura,
que apenas posso descrever
como sendo um duende de outra era
[..] alguém de cuja existência
não tinha a mínima ideia.
Tinha de explorar o encontro.
‘Olhe, não vamos perder-nos
com pormenores,
vamos apenas tentar encontrar
resposta a uma pergunta:
que é a vida?’

Um Acontecimento (O Elefante_Mrozeck)
Foto: martikson

Distant Voices (1)

BILL DOUGLAS TRILOGY EP1 PT2


a propósito de castelos vertiginosos, voltaren, ventanias e velas até..

quarta-feira, 14 de janeiro de 2009

darmos aquelas risadinhas parvas,
porque sem sentido,
aquelas que não lembrariam a ninguém.
passearmos de mãos dadas

no meio da multidão
e absorvermos todas as
músicas perdidas que soam das lojas
para quase dançarmos.
comprarmos um bilhete para
qualquer sítio longe,
de preferência com um nome bonito
e morrermos de felicidade.
aí, com tudo o que é banal.
era assim, assim mesmo que te queria hoje.
foto: álvaro dias

'The Irrepressibles' - 'In This Shirt' ( From The Film 'The Forgotten Circus')

Anything You Love That Much, You Will See Again

acontece sempre uma
embriaguez no silêncio
que se distende depois
preguiçosamente
na menina dos teus olhos




a circulação precoce dos relâmpagos
joão manuel de oliveira ribeiro
foto: martikson 'sleeping zone'
as palavras eriçam-se
quando lhes damos o coração
ficam tensas inexpressivas
frequentemente recusam
a abundância do sangue
como se afogadas
numa sístole demorada
calam por vingança
a respiração dos sonhos
[..] malditas sejam as palavras
que não guardam o coração nas mãos


a circulação precoce dos relâmpagos
joão manuel de oliveira ribeiro
foto: martikson ´dance into the light'
na tessitura dos nervos
no triângulo da garganta,
poderás ser a sonora evidência
do corpo sobrevoado pelas aves brancas.
desce.
sobe agora.
algum anjo terá chegado.
O frágil pulso nas claras toalhas do tempo.
o silêncio da inquietação.
o intacto reconhecendo-se.
talvez seja uma possibilidade.
nenhum de nós sabe mas o saber reduz-se
à liberdade de uma voz desconhecida.
quando no pulso incide a sede
o corpo quer respirar

onde se eterniza
para um seio ausente.
e se não alcança o que a distância encobre
deslizará na água bebendo a transparência
e o tempo será dele porque ele será o tempo.


horizonte a ocidente (adapt.)
antónio ramos rosa

foto: martikson 'face_acja'
tu com ela, eu contigo, ela comigo, eu com ela, tu comigo, ela contigo..
foto: martikson
'self-portrait'

The divine comedy - our mutual friend

terça-feira, 13 de janeiro de 2009

Juliette Binoche in The Unbearable Lightness Of Being


apetece-me ouvir-te
dizer 'amo-te'
mesmo que as palavras
vão com a primeira maré.
porque, estamos a ser
uma narrativa invulgar e bonita



foto: martikson
'dreaming under water'
com muita paz..
foto: martikson
'neck'

domingo, 11 de janeiro de 2009

quando morreu John Wayne,
o faroeste caiu-me do cavalo
de repente.
eu obviamente ainda cria piamente
na imortalidade dos pistoleiros bons,
desenhados ao poente sob o halo
do sol vermelho.
eu próprio me queria uma versão revisitada
do herói, fosse a soco, ou a tiros de palavras,
e haveria de entrar na cidade cavalgando em
zig-zag.
sob janelas e telhados floridos de rifles e
winchesters, da letal quadrilha dos irmãos
Campbell.
no saloon haveria mulheres de uma noite
para toda a eternidade, whisky no pó das
goelas e mesas repletas de
dados e batoteiros sérios.

plantas hidropónicas
fernando de castro branco
o remorso é uma parede mordida pelo eco.
e eu mordo a própria boca.
partirás então como chegaste, intruso.
(a febre é um porto onde se regressa sempre).
noites excessivas,
é este o centro do círculo da loucura.
e eu amava-te pela maneira como
os braços sangravam nos teus lábios.




iniciação ao remorso
jorge melícias
foto: karina bertoncini
observo fotografias como quem
filtra o instante e conto histórias
para não esquecer que a vida
é algo que se perde
à medida que as palavras se gastam.
Imagino lírios a crescer sobre o calor
do meu corpo e crianças a brincar por perto.
transfusão de vagas monstruosidades
como memórias de infância
ou melopeias.
mialgia de ser eu dormindo
em posição fetal ou alguém
que acreditasse que o universo
é uma caixa de brinquedos.
(a magnólia floriu este inverno
e eu não sei como dizer-te
que me comove ainda que dê flor).
devolve-me algo intacto como
o teu corpo na superfície intocável
do desejo de te encontrar.
porque sentir é compreensão excessiva
dos braços contra a luz,
imagem subterrânea do desgaste do desejo,
na complexidade circular do pensamento,
na demorada perplexidade que
nos expõe à insónia, na boca de alguém
à procura de algo por que valha a pena morrer.
decompõe a murmuração e eu,
desenho territórios e encontro
demónios nas encruzilhadas.
nenhuma das tuas palavras sirva para dizer
a desconstrução compulsiva dos abismos.
corro em círculos.
trago nas mãos espelhos suspensos,
falo da brutalidade efémera da asfixia,
da violência redimida das minhas mãos
sobre os teus cabelos de asa.


melopeia (adapt.)
josé rui Teixeira
foto: francesca woodman

sábado, 10 de janeiro de 2009

[..] quantas vezes me surpreendia
que os móveis fossem
os mesmos da véspera
e recebia-os com desconfiança,
não acreditava neles,
por ter dormido era outra
e no entanto os móveis
obrigavam-me às recordações
de um corpo a que não queria voltar,
que desilusão esta cadeira, eu
(as mãos minúsculas no fim de braços enormes,
se calhar composto de vários homens diferentes)
[..]


ontem não te vi em babilónia
antónio lobo antunes
foto: josé ferreira
Queria que me deixasses adormecer em posição fetal no teu corpo e me protegesses porque, perco o corpo com facilidade. Queria sorrir contigo, rir contigo, dar-te a mão, sentir-te chorar. Estar em silêncio. E sentir aquele cheiro único do café de manhã na cama. E ver o mar. E deitar a cabeça no teu peito num banco de jardim enquanto líamos uns poemas, ou escrevíamos. E subir os Clérigos para estar mais perto de qualquer coisa bonita. E fazermos compras, aquelas compras do dia-a-dia que só faz quem está junto com alguém. Ouvir a tua música e fazer amor com todas as guitarras ao teu lado, no chão, parede, cama, sofá de névoa e distorção.

guardei-a, na hipótese
de não a teres visto
tão bonita hoje, a lua
foto: helder mendes
[..] Lights are out, but anyhow
This is what they see
It's the devil,
It's you and me
Bring it on home,
and keep it warm
Won't leave you anyhow
[..]



The Devil, you and me
The Notwist
foto: karina bertoncini

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